Há quase um ano jogando pela Ferroviária/SP, a maringaense Beatriz Ferreira da Silva ou apenas Bia, tem 13 anos de idade e iniciou no futebol com apenas sete quando já se destacava com a bola no pé. Com a vontade e talento de Bia florescendo para treinar futebol, começou a batalha da família para conseguir um espaço em treinamentos na cidade, visto que não existia categoria feminina para que ela pudesse jogar. Assim os pais a levava para treinar com os meninos, no entanto encontravam muita resistência, pois algumas pessoas não aceitavam que ela treinasse no meio dos garotos.
Demorou um pouco, mas Bia finalmente conseguiu iniciar seu tão sonhado treino com bola. Começou com aulas de futsal no Centro Esportivo Três Lagoas e logo após no futebol do Projeto Social Índio (PSI), em Maringá. Passou por diversas equipes da região e foi conquistando seu espaço, sempre focada em seu objetivo.
Em 2021, Bia enfrentou um grande desafio em que treinadores, familiares, amigos abraçaram a uma causa. Ela foi impedida pela Federação Paranaense de Futsal de disputar a competição estadual com os meninos após já ter jogado duas partidas com a equipe do Itambé/PR (42 km de Maringá). Para que a atleta pudesse voltar a fazer o que mais ama foi realizada uma campanha a nível nacional pedindo a liberação para que Bia voltasse a atuar no campeonato, já que não existia a categoria sub-12 entre as meninas no Paraná. Após pressão, adiamento de partida, divulgação do caso em jornais, TV, internet e redes sociais, enfim a Federação autorizou e Bia pôde participar da competição levando pela primeira vez a cidade ao título paranaense.
PALAVRAS DA CRAQUE
A atual camisa 10 da equipe sub-14 da Ferroviária/SP, comenta que a vontade de jogar futebol chegou ao observar seu pai atuando e que o incentivo partiu primeiramente dos pais e logo depois a família como um todo. Bia também salienta as dificuldades que enfrentou e do sonho realizado após ter feito teste e passado a treinar com as meninas, já que até então, tivera que disputar espaço nos campos e quadras com meninos. “Foi muito difícil porque querendo ou não os meninos são bem mais fortes, tem mais resistência, mas apareceu uma oportunidade de fazer um teste na Ferroviária. Agora estou vivendo um sonho porque jogar comas meninas foi tudo que eu sempre quis”.
Bia entende que aprendeu e aprende muito com seus treinadores no dia a dia e agradece. “Da minha cidade o Pietro me incentivou, me ajudou muito e atualmente é o Anderson que pelos ensinamentos deles estou evoluindo cada vez mais”. A menina talentosa explica que a adaptação foi difícil por ter que ficar distante da família que mora em Maringá. A saída foi morar com conhecidos na cidade de Araraquara que acolheram a fera maringaense para morar junto com eles e assim poder continuar realizando seus sonhos. “Se não fosse eles eu não estaria na Ferroviária agora, então eu queria agradecer muito a eles”, complementa.
CONVOCAÇÃO
A notícia para vestir a amarelinha veio através da Ferroviária. O Clube reuniu as atletas na sala de imprensa, pois já aguardavam ansiosos a convocação da atleta. “Na verdade, nós já sabíamos, então a gente teve a ideia de fazer algo diferente, tomamos os celulares delas e foi bacana ver a carinha dela, a felicidade dela em saber que estava sendo convocada, foi pega de surpresa”, descreve o momento o técnico Anderson.
Assim que soube da notícia da convocação Bia nos contou que não deu para pensar em nada e reagiu comemorando muito na hora já que para alcançar esse objetivo muito foi feito e trabalhado. “Eu só comemorei porque é muita felicidade. Esse é um sonho desde criança e pra mim, chegar a ser convocada tive que treinar muito me dedicando dentro de campo. Estou muito feliz agora, grata por quem me ajudou nesse tempo”.
Os primeiros treinos com a Seleção Brasileira Sub-15 é na Granja Comary, em Teresópolis no Rio de Janeiro e acontecem entre os dias 17 e 22 de julho.
FAMÍLIA
A mãe da jogadora mirim, Adriana dos Santos Silva explica que a vontade de atuar no futebol partiu de Bia e também por influência da família que sempre esteve no meio esportivo. O pai de Bia, André Ferreira da Silva, por exemplo, sempre jogou em competições amadoras de futebol, além do tio, o conhecido atleta de futsal, o ala Parrel, também nascido em Maringá, que atualmente joga na Itália. Segundo Adriana o amor pelo futebol contagia a todos. “Ela tem um irmão de 12 anos que se chama Carlos André Ferreira da Silva e que também é apaixonado por futebol e está nessa vida de correr atrás de bola”.
LAPIDAÇÃO
Um dos treinadores que mais conviveu e treinou a Bia foi Pietro Betin, que esteve por mais de três anos lapidando a atleta em Maringá e região. Em 2019 ela foi chamada para disputar uma competição no time comandado por Pietro e se deu muito bem. “Foi um encaixe perfeito ela na nossa equipe. Nós tínhamos um projeto que era elevar o nível desses meninos 2009 e foi muito bom. Começamos a treinar de três a quatro vezes por semana. Durante dois anos nós treinamos sábado, domingo, treinamos quase todos os feriados dos anos seguintes, não paramos de treinar na pandemia. A gente sabia que a Bia como outros meninos tinham o potencial de chegar longe”, explica o treinador.
Pietro esclarece que não foi fácil para ele e seus auxiliares compreender até onde ia o potencial, a intensidade, a forma de disputar a bola e como falar com a promissora garota em meio aos garotos. “Tem alguns termos que se usa no futsal que são mais masculinos. A gente adaptou tudo isso para que ela pudesse se sentir sempre confortável, sempre fazer parte da família”.
O treinador conta que o papel do técnico é dar as ferramentas para quem está disposto a superar seus limites a cada dia e destaca que Bia sempre foi acima da média e a convocação não foi surpresa para ele. “A Bia desde pequena sempre mostrou um talento fora do normal. Nós sabíamos que isso ia acontecer. Não sabíamos que ia ser tão rápido, mas já era esperado, a gente fica muito feliz e segue torcendo por ela. Que venha sub-17, sub-20 e eu tenho certeza que daqui alguns anos ela vai estar brilhando com a camisa da seleção brasileira principal”.
Anderson Clayton, atual técnico de Bia na Ferroviária enxerga na jogadora muito potencial destacando a dedicação e entrega nos treinos e a particularidade de trabalhar bem com os dois pés, algo raro de se encontrar hoje em dia. O treinador comenta ainda mais uma qualidade e algo em que ela pode melhorar. “Ela tem uma leitura muito boa de jogo, observa alguns comportamentos e isso faz com que ela seja diferente. Algumas dificuldades que ela tinha no começo e que melhorou bastante foi o cabeceio, mas isso é geral no feminino, a gente coloca sempre na programação de trabalho”.
O técnico Anderson que está há vários anos na base da Ferroviária, equipe espelho no futebol feminino brasileiro, relata que o processo de captação e o trabalho é bem árduo, mas que vale muito a pena, afinal encaminhar o futuro dessas crianças e ajudar a construir sonhos é gratificante segundo ele “A felicidade é enorme e é sinal de que as coisas estão caminhando e que estamos no caminho certo”.