Tanto o mercado de soja quanto o de milho têm trabalhado com a expectativa de fechar o ano-safra com baixos estoques mundiais dessas commodities. O ritmo forte das exportações e as indicações de estoques baixos estão dando suporte aos preços internacionais dos produtos e o resultado disso é o de um cenário de preços bons na safra, avaliam os especialistas.
As exportações de soja dos Estados Unidos, segundo dados da Usda (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos), estão tão aceleradas que o país, se seguir no ritmo atual, terá de elevar as importações da oleaginosa, apesar de ser o segundo maior produtor e exportador mundiais. A expectativa é de chegar ao final desta safra, em agosto, com exportações de 61 milhões de toneladas, 34% maiores do que as da safra anterior, e apenas 3,3 milhões de toneladas de soja de estoque. um dos piores volumes da história, suficiente para apenas 10 dias de consumo.
Neste cenário, sobra para a América do Sul, principalmente Brasil e Argentina, a responsabilidade de abastecer o mercado mundial. O problema, avaliou o vice-presidente executivo da Cocamar, José Cícero Aderaldo, em recente palestra, é que os estoques de soja também são muito baixos no Brasil, onde a produção na temporada 2019/20 foi de 126 milhões de toneladas, para um consumo interno de 46 milhões e exportações de 82 milhões de toneladas, puxadas pela China. “No ano passado ultrapassamos os EUA como os maiores produtores mundiais de soja e devemos consolidar isso em 2021”, afirmou. Os argentinos, com 48 milhões de toneladas de soja, são o terceiro maior produtor mundial.
Segundo estimativas, a produção brasileira para o ciclo 2020/21 é de 133 milhões de toneladas de soja, consumo de 48 milhões e exportações de 85 milhões de toneladas. Com isso, em três anos, a relação estoque/consumo de soja deve ter queda de 6% para 3%. No mundo, essa mesma relação pode declinar de 33% em 2018/19 para 23% em 2020/21.
Com a colheita de soja se iniciando na região, os produtores rurais precisam estar atentos ainda há outros fatores que influenciam diretamente na cotação das commodities, como os indicadores da economia brasileira, que se refletem na variação cambial. José Cícero Aderaldo comentou que em 2020, por conta da pandemia do novo coronavírus, o PIB mundial apresentou queda de 4,3%, ante um crescimento de 2,3% em 2019, havendo a projeção de voltar a crescer 4% neste ano, dependendo do controle da pandemia. Das grandes economias, apenas a China teve crescimento (2,3%, mas bem abaixo dos 6,1% de 2019 e expectativa de acelerar para 7,9% em 2021).
No Brasil, citou ainda vice-presidente executivo da Cocamar, o PIB caiu 4,37%, contra os 1,4% de crescimento em 2019 e projeção de ir a 3,45% de expansão neste ano. Em relação à taxa Selic, a estimativa para este ano é de 3,25%, frente aos 2% do final de 2020 e os 4,5% do ano anterior. Puxada pelos produtos do agronegócio, o saldo da balança comercial brasileira foi de US$ 55,05 bilhões, acima dos US$ 44,5 bilhões de 2019, devendo repetir essa performance em 2021.
A retração mais impactante, observada em 2020, foi do investimento estrangeiro, de US$ 76,12 bilhões em 2019 para US$ 40 bilhões no último ano, podendo subir para US$ 60 bilhões neste ano. A previsão para a taxa de câmbio é ficar em torno de US$ 5,00 em 2021, ante os US$ 5,20 médios de 2020 e os US$ 4,10 de 2019.
Na região de Maringá, que engloba 31 municípios, onde a colheita está bastante atrasada, com poucas áreas colhidas, 95% das lavouras estão em fase de frutificação e 5% em estágio de maturação, comenta Juceval Pereira de Sá, chefe do Núcleo Regional de Maringá da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Paraná (Seab). Dos 296,5 mil hectares cultivados com soja na região, 89% das lavouras estão em boas condições, o que significa produtividades entre 140 a 150 sacas por alqueire, 10% estão em condições medianas, 80 a 100 sacas por alqueire, e 1% em condições ruins, em torno de 60 sacas por alqueire de média, avalia Moises Bolonhez, responsável técnico do Departamento de Economia Rural (Deral) da Seab.
Bolonhez ressalta que as perdas têm ocorrido mais devido ao excesso de chuva, falta de luminosidade e dificuldade de efetuar os controles fitossanitários de pragas e doenças do que em relação à estiagem. Entretanto, há a expectativa de que as lavouras em boas condições surpreendam positivamente e quanto maior o percentual, dentre as boas lavouras, que se aproxima das médias mais altas de produtividade, menor a influência dos percentuais de lavouras em condições medianas ou ruins em termos de média de produção geral. O Deral tem trabalhado com a expectativa de fechar a safra na região de Maringá com uma produção de 1,055 milhão de toneladas.
“Por isso o mercado está cauteloso. Este ano o número de fixações de vendas antecipadas, contratos futuros ou venda de insumos vinculada a troca por produtos foi um dos maiores dos últimos anos. O percentual de soja comprometida de forma antecipada normalmente gira ao redor de 30%, mas este ano em Maringá já está em 43,7% do volume total de soja esperado na safra, e no Paraná, 44,2%. As negociações antecipadas foram aceleradas pelo bom preço futuro”, avalia.
Milho tem cenário parecido
Em sua palestra, o vice-presidente executivo da Cocamar, José Cícero Aderaldo comentou ainda que os baixos estoques de milho também causam preocupação ao mercado, tanto nos países produtores, como EUA e Brasil, quanto em nível mundial. No Brasil, por exemplo, que produziu 103 milhões de toneladas no ciclo 2019/20, a demanda interna consumiu 69 milhões de toneladas e a exportação atingiu 35 milhões, para uma relação estoques/consumo de 18%. A previsão para o período 2020/21 é de uma produção de 102 milhões, consumo interno de 72 milhões e exportação de 35 milhões, para uma relação estoque/consumo de 12%.
Conforme relatório do Usda, também há queda nos estoques de milho nos Estados Unidos, principais produtores mundiais: 38,2 milhões de toneladas no final desta safra, um volume 22% inferior ao do ano anterior e a menor relação estoque/uso desde a safra 2013/14. E, em nível global, também há decréscimo na relação estoque/consumo: de 28% em 2018/19 para 27% em 2019/20 e 25% em 2020/21.
Na avaliação de Aderaldo, há muitas incertezas quanto aos reais estoques chineses, país que é grande demandador do cereal, e sobre qual a participação que terá na demanda. Se por um lado o país asiático cogita ter estoques de 190 milhões de toneladas, de outro demonstra avidez nas importações. A importação, que somou 7,6 milhões de toneladas na safra passada, poderá ficar próxima de 30 milhões neste ano. O Usda já elevou a necessidade de compra chinesa de 17,5 milhões de toneladas para 24 milhões. A situação pode complicar se houver problemas climáticos nos países produtores. Detalhe: nos EUA, onde o plantio começa em abril, a soja, com preço bastante compensador, deve avançar sobre áreas de milho.