Dia do Quadrinho Nacional: editora criada em 1959 foi pioneira em gibis totalmente brasileiros

Dracula

Detalhe da capa com arte de Roberto Barbist para revista da fase Taika (Crédito: Reprodução/Guia dos Quadrinhos)

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“Escrita e desenhada totalmente no Brasil”. Era com este selo na capa que a editora Continental apareceu no mercado de quadrinhos do país, nos anos de 1960. Seu objetivo era publicar somente material nacional feito por desenhistas, roteiristas, coloristas… enfim, equipe brasileira.

Na verdade, essa casa fora fundada em 1959, na cidade de São Paulo (SP), por Miguel Penteado e Jayme Cortez, quadrinista que se tornou referência para o gibi. Nesta terça-feira, 30 de janeiro, Dia do Quadrinho Nacional, nada mais apropriado do que recordar a trajetória da Continental. Ou melhor, Outubro, ou ainda Taika – logo, você vai entender o porquê desses três nomes.

Segundo o jornalista, pesquisador e escritor Gonçalo Junior, a Continental surgiu com o propósito de só publicar HQs feitas por quadrinistas do país, funcionando como uma espécie de trincheira do movimento dos artistas brasileiros pela nacionalização dos quadrinhos naquela época. “Suas revistas mostraram aos grandes editores e aos parlamentares que era possível montar uma estrutura rentável exclusivamente com produção nacional de histórias em quadrinhos”, escreve o autor no clássico livro “A Guerra dos Gibis: a formação do mercado editorial brasileiro e a censura aos quadrinhos, 1933-64” (ed. Companhia das Letras).

No começo, os fundadores puseram nas capas dos seus gibis um selo verde e amarelo, com a frase “Escrita e desenhada no Brasil”.

Naquele momento, segundo Gonçalo, era uma proposta ousada e arriscada, já que nenhuma editora até então tinha se aventurado a fazer somente revistas nacionais. Era mais seguro investir em material importado a preços mais baixos. Mas os dois sócios acreditaram no projeto nacionalista. “E a euforia provocada pelo projeto da Continental foi imediata entre os artistas. Em pouco tempo, a editora conseguiu reunir um grupo de aproximadamente cinquenta profissionais, entre roteiristas, letristas, desenhistas e capistas”, contextualiza o escritor.

Entre os nomes, destaque para figuras que fizeram história nas histórias em quadrinhos como Nico Rosso, Júlio Shimamoto, Flávio Colin, Gedeone Malagola, Luiz Sardenberg, Waldir Igayara de Souza, Mauricio de Sousa…

Aliás, em seu primeiro ano de vida a editora lançou a revista “Bidu”, estrelada pelo cachorrinho azul de Mauricio, que naquele período era repórter policial do jornal “Folha da Manhã” (que viria a ser depois a “Folha de S.Paulo”). Só mais tarde, esse quadrinista se tornaria conhecido como o criador da Turma da Mônica.

Bidu tinha sua própria revista na fase Continental (Crédito: Reprodução/Guia dos Quadrinhos)

Terror
O carro-chefe da Continental era a linha de gibis de terror. Gonçalo conta que a casa mandou para as bancas de jornal o maior pacote de quadrinhos do gênero que uma editora já lançara num período de apenas 12 meses em sua estreia no mercado: “Terror”, “Contos Macabros”, “Histórias do Além”, “Histórias Macabras” e “Seleções de Terror”.

Por exemplo, o número de estreia de “Seleções de Terror”, com data de junho de 1959, apresenta a HQ “A volta do Drácula”, com argumento e desenho de Júlio Shimamoto, o Shima, desenhista de ascendência nipônica em atividade até hoje. A capa da edição é do editor Cortez.

Além do Bidu, a Continental também apostou em personagens com o Capitão Estrela, um super-herói cuja revista tinha arte de Juarez Odilon.

E “Zaz Traz”, primeiro gibi a publicar histórias de Mauricio de Sousa (roteiro e arte). No número 1, a revista apresentava as personagens Bidu, Franjinha, Jeremias, Titi, Manezinho, Humberto, Seu Carlos (Pai do Franjinha) e Dona Elza (Mãe do Franjinha), em período anterior ao nascimento da Mônica e do Cebolinha.

O site “Guia dos Quadrinhos” catalogou ao menos 13 títulos com 110 edições publicados pela Continental.

Gênero do terror era o carro-chefe da editora, nas três fases (Crédito: Reprodução/Guia dos Quadrinhos)

Outubro/Taika
Mas quase dois anos depois de sua fundação, a editora foi obrigada a trocar de nome. É que já havia outra empresa com a mesma denominação, em processo de falência. Assim, para evitar mais problemas, virou Outubro. Só que Victor Civita, dono da Abril, havia registrado como propriedade sua para fins editoriais o nome de todos os meses do ano – de janeiro a dezembro.

Como Penteado não cedeu, tudo acabou num processo judicial que se arrastaria por cinco anos. Pior para a Outubro, que lançou seu último gibi, “Páginas Sinistras”, em 1966. Ela mudou mais uma vez, adotando Taika, em homenagem à filha de um dos novos sócios, Eli Lacerda. Miguel Penteado saiu da antiga Outubro em 1966, para criar a Gráfica Editora Penteado (GEP).

Os novos donos, liderados por Manoel César Cassolli e Lacerda, preservaram a tradição de publicar apenas material nacional e o selo “Totalmente escrita e desenhada no Brasil” foi mantido até o começo dos anos de 1970, conforme Gonçalo Junior.

Sob o nome Outubro, a editora tem 34 títulos cadastrados no “Guia dos Quadrinhos”, somando 402 edições no total. Já na fase Taika, são 89 títulos, somando 637 edições no total.

Uma das marcas era o selo no alto da capa com ‘Escrita e desenhada totalmente no Brasil’ (Crédito: Reprodução/Guia dos Quadrinhos)

Final
A Taika ficava na Liberdade, em São Paulo, publicando gibis de faroeste, super-heróis, comédia, fantasia e, claro, terror. Esta era a grande aposta nos anos de 1970; mas sem a mesma força de antes.

Assim, a editora que fora fundada por Cortez e Penteado encerrou suas atividades em 1978.

Entenda
Celebrado em 30 de janeiro, o Dia do Quadrinho Nacional foi criado por causa de “As Aventuras de Nhô-Quim ou Impressões de uma Viagem à Corte”, considerada a primeira história em quadrinhos do país. Em forma de páginas duplas, a cada semana a história mostrava Nhô-Quim viajando de Minas Gerais para a corte do Rio de Janeiro.

Essa aventura começou a ser publicada justamente em 30 de janeiro de 1869, pelo cartunista italiano radicado no Brasil Angelo Agostini.

A data passou a comemorar o Dia do Quadrinho Nacional porque, em 1984, a Associação dos Quadrinhistas e Caricaturistas de São Paulo realizou uma pesquisa na Biblioteca Nacional (Rio de Janeiro/RJ) e verificou que o Brasil era pioneiro na publicação dessa linguagem. Depois disso, a AQC-SP levou toda a documentação das pesquisas aos órgãos responsáveis para conseguir que esse dia, 30 de janeiro, entrasse no calendário oficial do Brasil.

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