Há cinco anos, uma canelite tibial adiou a estreia olímpica de Bianca Silva às vésperas dos Jogos de Rugby do Rio de Janeiro. Reagir àquele baque não foi fácil para a jovem de então 18 anos, já uma promessa da seleção brasileira feminina de rugby.
“Foi uma questão de pressão, psicológica mesmo. Ter pouca idade, enfrentar coisas para as quais não estava preparada, ter uma vida profissional [no esporte] e ver isso como algo real. Impactou forte, não aguentei, desisti, parei de jogar depois da Olimpíada. Fui correr atrás de emprego. Minha irmã trabalhava em um restaurante de shopping, fiz um currículo e enviei”, recorda Bianca à Agência Brasil.
“Estava decidida que não voltaria, de tão chateada que fiquei [pela ausência em 2016]. Aí, recebi o convite para voltar. Primeiro, disse não. Depois, sentei e pensei: o que quero realmente? Meu coração ainda arde para jogar. Percebi que merecia viver aquilo. E voltei. Foi uma injeção de força. Daqui, não saio mais”, diz a paulista de 23 anos.
Não demorou para Bianca se firmar novamente na seleção. Em 2018, tornou-se a brasileira com mais tries (quando o atleta cruza a linha final do campo com a bola e a coloca no chão, vale cinco pontos) em uma Copa do Mundo de rugby: foram cinco logo na sua estreia na competição. No mesmo ano, foi eleita a melhor atleta da modalidade no país no Prêmio Brasil Olímpico.
“Foram dois anos muito especiais, com muita coisa extracampo que agregou experiência para conseguir trazer inspiração, de sair de algo ruim, ir para cima e ser destaque”, conta a jovem.
Inspiração que ela própria se tornou em Paraisópolis e no projeto onde foi revelada, que atende cerca de 200 jovens carentes de 6 a 18 anos. A segunda maior favela da capital, onde vivem mais de cem mil pessoas, fica na Vila Andrade, terceiro distrito paulistano com maior ocupação por favelas (34,7%) segundo o Mapa da Desigualdade de 2020, da organização não-governamental (ONG) Rede Nossa São Paulo.
“É muito legal [o reconhecimento], principalmente dos menores, por chegar aqui independente da dificuldade, de onde cresceu, superar a expectativa que tem, de que se você mora na comunidade, ficará lá para sempre e vira marginal. [Cria o sentimento de] querer chegar na seleção ou ao máximo de qualquer coisa que se sonhe. Eu me vejo nesse papel, das pessoas olharem para mim, dizerem ‘olha onde ela está’, servir de inspiração. As pessoas verem que é possível, independente do que falam, progredindo e buscando o melhor”, destaca Bianca, que atua pelo Leoas de Paraisópolis.
A brasileira também se tornou referência junto à World Rugby, a confederação internacional da modalidade. Em 2019, ela foi uma das escolhidas da entidade para ilustrar a campanha Unstoppables (imparáveis, em inglês), para impulsionar o esporte feminino. Nome bastante pertinente, considerando a característica mais marcante de Bianca, a velocidade.
“Sempre fui muito rápida. Corria muito na rua, talvez isso tenha me ensinado muito. Só que a minha técnica de corrida foi trabalhada. Eu tinha uma técnica não tão boa, corria sentadinha, abaixadinha. Fiz alguns [exercícios] coordenativos de postura, ajuda com braço e perna. Se você reparar, meu joelho não fica mais flexionado”, descreve Bianca.
“A velocidade do Brasil é uma fortaleza, então elas [adversárias] tentam nos inibir. A marcação fica em cima. Não só eu, mas as meninas da mesma posição discutimos formas de elas não ficarem tão em cima. Se deixarem correr, já era [risos]”, completa.
Em abril, as Yaras tiveram pela frente alguns dos rivais olímpicos em dois torneios realizados em Dubai (Emirados Árabes Unidos). Foram duas vitórias sobre japonesas e quenianas e uma diante do time B francês, e derrotas para norte-americanas, França A e Canadá (duas para cada).
“Foram jogos divertidos demais. Recebemos mensagens de que estava legal de ver nossas partidas. Nossa expectativa [para Tóquio] é levar algo diferente. A equipe se divertir em campo e ganhar assim. Queremos mostrar o que é ser uma Yara e o que é o rugby brasileiro. Apresentar nosso melhor lado e versão. Fazer com que as pessoas se divirtam nos vendo jogar”, conclui Bianca.
Edição: Fábio Lisboa
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Texto extraído do site Agência Brasil.