Taí uma história que só poderia ter ocorrido no Brasil. Os mutantes mais famosos da Marvel Comics, os X-Men, já foram escritos e desenhados em nosso país. É um fato pouco conhecido da maioria dos leitores.
Toda essa produção tupiniquim pode ser conferida no livro “X-Men Made In Brasil” (série GraphicBook), das editoras Criativo e GRRR!. As dez HQs estão restauradas e reunidas neste álbum, que tem 116 páginas e formato 21×28 cm.
A publicação de histórias em “versão nacional” dos mutantes ocorreu na virada dos anos de 1960 para os 70, pelas mãos da Gráfica Editora Penteado Ltda, a GEP. Segundo o jornalista Gonçalo Junior (no livro “A guerra dos gibis”), essa casa nasceu após Miguel Penteado ter deixado a ed. Outubro em 1966. Penteado se juntou a Luiz Vicente Neto e fundou a GEP, passando a prestar serviços gráficos a terceiros.
Depois de um intervalo em que a gráfica foi vendida para a Giroflê, a GEP comprou novas máquinas e começou a editar revistas “que seguiram a tendência do mercado da época, ainda dominado pelos gibis de terror e faroeste”, diz Gonçalo.
Além de “Raio Negro” e “Múmia”, a editora comandada por Penteado (que faleceu em 2001, aos 83 anos) ficou conhecida pelo material licenciado da Marvel, nas chamadas Edições GEP: “O Surfista Prateado”, “X-Men”, “Capitão Marvel” etc.
No Guia de Quadrinhos, é possível encontrar a capa do número de estreia de “X-Men”, revista publicada em janeiro de 1969. São 36 páginas no chamado formato americano (17 x 26 cm), miolo preto/branco e lombada com grampos. É a fase clássica dos personagens, escrita por Stan Lee e Jack Kirby.
O que chama atenção é a presença de uma aventura intitulada “Luta de titãs!”, de 8 páginas, sem autoria identificada no Guia. Durante um safári na África, Hank McCoy, o Fera, encontra um homem das cavernas dormindo. Ao acordar, o primitivo luta com o X-Man.
No número seguinte, outra aventura sem crédito: “O dia em que Jean se tornou líder!”, também de 8 páginas. Aliás, à época essa revista mensal da GEP era formada por uma HQ da dupla Lee/Kirby e mais um material curto.
Já na edição 4, de abril de 1969, aparece o crédito na segunda aventura: arte de Walter S. Gomes, jovem desenhista brasileiro. Sinopse: a máquina Cérebro detecta a presença de um novo mutante e os X-Men se apressam em encontrá-lo. Ao chegarem ao local, são recebidos por um horrível gigante com oito braços. Enquanto nossos heróis tentam impedi-lo, o Fera parece fugir, mas retorna com uma imensa concha de chumbo, com a qual derrota o velhaco.
No número 5, arte de Gomes para as 8 páginas de “A casa assombrada”. E, em “X-Men”#6, a história brasileira “Os mutantes de Júpiter!” com roteiro de Francisco de Assis e arte de Walter S. Gomes.
Mas em “X-Men”#7, o roteirista Gedeone Malagola (1924-2008), um dos grandes nomes da Nona Arte no Brasil, assina o roteiro de “O homem que queria dominar o mundo!”, com arte de Gomes.
GÊNESE
Segundo Marcio Baraldi, em texto para o site da Criativo, em 1969 os personagens mutantes da Marvel ainda eram desconhecidos no Brasil e, nos Estados Unidos, ainda não faziam sucesso. Assim, o material editado pela GEP foi cancelado, durando apenas dez números e dois almanaques (um apenas com reprises).
Como os gibis da GEP tinham mais páginas livres que os originais americanos, a editora teve a ideia de produzir HQs curtas com os personagens para completar as revistas. Para isso, foram escalados o experiente Gedeone Malagola nos roteiros e o então jovem iniciante Walter Gomes, de apenas 18 anos, nos desenhos.
“O resultado foram dez histórias totalmente independentes da cronologia oficial da Marvel, mas muito criativas e divertidas. Histórias que, durante décadas, só o Brasil conheceu! Aliás, mesmo no Brasil pouca gente conheceu, já que as tiragens da GEP não eram altas, o que fez com que tais gibis se tornassem muito raros nos dias de hoje, verdadeiros itens de colecionador”, resume Baraldi.



