Na era digital, é preciso checar tudo antes de repassar a outros, diz Felipe Neto

Na era digital, é preciso checar tudo antes de repassar a outros, diz Felipe Neto

A ONU News divulga nesta sexta-feira, 12 de maio, o Podcast ONU News com Felipe Neto. O influenciador digital esteve no início deste mês na sede das Nações Unidas para participar do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, a convite da Unesco.

Na entrevista, o youtuber disse que é preciso promover uma cultura de checagem do conteúdo na internet, antes de repassar as mensagens. Para ele, esta é uma tarefa de todos.

Felipe Neto fala ao Podcast ONU News sobre futuro da era digital, jovens e regulação da internet

Cultura de checagem

“A longo prazo, de solução: que é instruir, cada vez mais, campanhas de    que tudo que você recebe, na internet, você precisa checar cinco vezes. Tudo. Não importa se foi sua mãe que mandou, não importa se foi a pessoa em que você mais confia na Terra, não importa se você ouviu do influenciador que você confia. Tudo você tem que checar.”

Felipe Neto afirma que é preciso diferenciar o agente que cria conteúdos falsos deliberadamente e aquele que passa adiante por apenas confiar no que está lendo ou em quem enviou.

Após falar na Assembleia Geral, Felipe Neto contou que começou a gravar vídeos como uma brincadeira, sem a menor ideia de que isso se tornaria uma profissão rentável. Hoje, com 45 milhões de seguidores e eleito uma das “100 pessoas mais influentes do mundo” pela revista Time em 2021, ele diz estar sempre se “reinventando”.

A presença dominante das mídias sociais levou a um declínio na demanda pelo jornalismo impresso tradicional

Crianças viciadas por timelines infinitas

Ao ser questionado sobre o impacto da longa exposição das crianças à internet, o youtuber disse que até os dois anos de idade “a recomendação oficial é zero tela”. Ele ponderou que isso não é realista e que é “muito injusto” acusar os pais.

O ideal é o acompanhamento dos responsáveis, pois as redes sociais não têm filtro para impedir que as crianças acessem conteúdo adulto.

“Essas plataformas não estão nem aí para qual é a idade da criança, para o risco que está sendo colocar aquela criança exposta a determinados conteúdos e principalmente no vício que vai gerar na criança. Então, principalmente as timelines infinitas de vídeos curtos como TikTok, Reels, Shorts, Kwai etc são criadas para viciar.”

Segundo Felipe Neto, a consequência dessa dinâmica é o vício comportamental, caracterizado pela repetição involuntária de uma ação danosa. Ele ressaltou que é comum encontrar jovens que ficam 7 ou 8 horas por dia nessas timelines sem conseguir sair, “presas pela liberação de dopamina no cérebro”.

“Sou extremamente preocupado” com inteligência artificial

O influenciador revelou ainda que é “extremamente preocupado” com o avanço da inteligência artificial. Ele disse que essa tecnologia “impulsiona tudo” na internet, inclusive o algoritmo de recomendação que decide “qual o próximo vídeo que você vai assistir”. O poder de criação da inteligência artificial é outro ponto de atenção.

“A máquina está fazendo exatamente o que o ser humano faz em termos de criatividade. Até que ponto isso vai chegar? Porque quanto maior o processamento e a capacidade dessa máquina, ela vai ser capaz agora de antecipar coisas que nós não conseguimos prever. Como? Qual vai ser a próxima inteligência artificial? Não somos nós que vamos programar. Vai ser a máquina. E a coisa começa sair, completamente, da nossa linha de raciocínio de controle.”

Sobre seu próprio consumo de internet, Felipe Neto afirmou ser um “viciado” e considera que a “esmagadora maioria” da população também é. Ele disse que devido às grandes descargas de dopamina dos meios digitais, o ser humano “tem uma incapacidade hoje de sentir tédio”.

Influenciador digital Felipe Neto concede entrevista à ONU News

Cooptação dos jovens

Para o youtuber, o papel do jovem na política vem se tornando cada vez mais potente porque “hoje qualquer pessoa tem voz”. Por outro lado, ele considera que os jovens “são muito cooptáveis”.

“Ele começa a se encantar por esses discursos rasos, populistas e que não funcionam para absolutamente nada, e surgem esses expoentes políticos. Então, fazer com que o jovem tenha contato com conteúdo que seja leve, dinâmico e que traga informação precisa sobre política e sociedade é fundamental. Só que hoje, há muito pouco trabalho relacionado a isso.”

Felipe Neto disse que “sob nenhuma hipótese” pretende se candidatar a cargos políticos. Ele se considera um “agente político externo”, capaz de atuar sem as “implicações e limitações” de uma posição tradicional.

Causas políticas

Dentre as pautas em que Felipe Neto tem atuado estão a regulamentação da internet e a luta contra a desinformação e o discurso de ódio.

Ele considera importante diferenciar manifestações de indignação da prática sistemática de “inferiorização de pessoas que já são marginalizadas”. O discurso de ódio é ligado a crimes tipificados, como racismo, transfobia e misoginia e a revolta contra esses atos precisa ser respeitada.

 

Confira alguns trechos da entrevista:

 

Proteção de ataques na internet

Então, primeiro, a gente precisa proteger as pessoas mais vulneráveis que são atacadas pelo que elas são. Depois, a gente precisa proteger pessoas que são expostas à situação de desinformação e ataques à reputação.”

Crianças usando a internet

Até dois anos de idade, a recomendação oficial é zero tela.  Zero. Já foi comprovado, inúmeras vezes, por diversos estudos diferentes, que até dois anos de idade toda exposição à tela é prejudicial.  Isso é realista? Não é. Hoje, com tecnologia invadindo e os pais com, cada vez menos tempo, porque hoje pai e mãe têm que trabalhar. Os dois estão sempre ocupados. O tempo é cada vez mais escasso. Você conseguir um tempo em que a criança fica ali, né, em paz, vamos dizer assim, acaba sendo sagrado para os pais. Então, é muito errado a gente apontar o dedo na cara dos pais, que não têm tempo, que são massacrados pelo atual sistema para conseguirem pagar as contas, “vocês são pais ruins porque estão deixando a criança na frente da tela”, é muito injusto.  Então, o que a gente precisa tentar é minimizar o dano, diminuir o perigo. Então, até dois anos, a recomendação é zero. Se não for possível, que o pai e a mãe assistam junto da criança. Não apenas deixem a criança com o device, com o aparelho solta num canto, concentrada assistindo.  Isso é extremamente perigoso. A gente está falando de linhas do tempo aí como TikTok, Reels e Shorts no YouTube que não têm nenhum tipo de trabalho para se precaver o que a criança vai assistir. O TikTok principalmente. Você não tem nenhum tipo de filtro ali. A criança vai entrar num vídeo bonitinho, fofinho e depois está vendo um vídeo adulto. Então é fundamental que determinadas redes não entrem em contato com as crianças.

Usando a internet para o bem

Cara, em primeiro lugar, é importante dizer isso mesmo. Não adianta a gente só falar mal da internet, do celular, smartphone… Todas essas ferramentas são fantásticas, mudaram o mundo. A gente pode usar isso pro bem todos os dias. Eu crio conteúdo, Eu estou lá. Eu produzo vídeos. Eu quero levar entretenimento pras pessoas, alegrar a família, tirar risada. O que a gente precisa é moderar as coisas. É isso que a gente tem que defender, né? E o papel do jovem, hoje, ele vem se tornando cada vez mais potente porque hoje qualquer pessoa tem voz. Então todo mundo pode ser ouvido. Você pode falar essa frase de duas maneiras: “Todo mundo hoje pode ser ouvido” porque, ao mesmo tempo que a internet empodera vozes que podem ser revolucionárias para o bem. Ela também empodera vozes revolucionárias para coisas bem complexas. Como a gente está vendo aí: anti ciência, contra a democracia, teocratas que querem posição da religião na política. Coisas realmente terríveis que remetem a um resgate do século 16 e é por isso que a gente chama essas pessoas reacionárias. Então impedir o avanço desse tipo de comportamento extremista, conservador não tem problema, mas sim o ultraconservadorismo, é fundamental.

Preconceito linguístico

A gente se coloca numa posição de superioridade. E a gente é ensinado desde o berço, isso. A tratar mal e com deboche e inferiorização quem troca palavras, quem escreve o que a gente chamada errado. Trocar o mas por mais. Escrever com certeza junto e tudo mais. Quando você vai estudar e conversar com pessoas que estudam Letras, você descobre que isso é um profundo preconceito. A função da língua é se fazer entender. Ponto. Ela não é demonstrar superioridade. Então eu pego muito o com certeza como exemplo porque eu não duvido que daqui a 50, 60 anos, o com certeza seja junto. E todos nós que ficamos debochando, ridicularizando, inferiorizando essas pessoas, vamos ficar com cara de tacho. Assim como aconteceu quando farmácia era escrito com PH e quem escrevia com F era ridicularizado: “Você não sabe escrever. Você é burro.” E a gente faz isso agora. Exatamente igual.  

Inteligência Artificial

Então, as pessoas tendem a pensar que a inteligência artificial é o ChatGPT. É aquele chat que você vai conversar como robô. A inteligência artificial, ela está ali o tempo inteiro na internet. Ela que impulsiona tudo.

Hoje, está se falando muito sobre esses riscos da perda de empregos, de substituições de determinadas funções e tudo mais, graças à inteligência artificial que está chegando em níveis absurdos.

Eu sou extremamente preocupado com este tema porque a mente explode quando você começa a fazer certas perguntas. A gente está criando uma inteligência artificial hoje que é capaz de criar. Ela é capaz de do nada reunir elementos que existem na natureza e na criação humana, unir isso e criar algo completamente novo.

Esse é o processo que nós fazemos como seres humanos. Quando a gente cria uma música, a gente não inventa uma nota nova, a gente não inventa um som novo. A gente reúne o que existe. A máquina está fazendo exatamente o que o ser humano faz em termos de criatividade. Até que ponto isso vai chegar? Porque quanto maior o processamento e a capacidade dessa máquina, ela vai ser capaz agora de antecipar coisas que nós não conseguimos prever. Como? Qual vai ser a próxima inteligência artificial? Não somos nós que vamos programar. Vai ser a máquina. E a coisa começa sair, completamente, da nossa linha de raciocínio de controle. Esse é o meu medo.

Leia a entrevista na íntegra:

Fonte: Organização das Nações Unidas

Sair da versão mobile