A lista anual da ONU das partes envolvidas na violação contra crianças em conflitos inclui, pela primeira vez, as forças russas e grupos associados pela atuação na Ucrânia.
A informação do Relatório Crianças e conflitos armados foi confirmada esta terça-feira a jornalistas, em Nova Iorque, pela representante especial do secretário-geral para crianças e conflitos armados.
Armamento explosivo com impacto em áreas amplas
Virgínia Gamba disse que a decisão do secretário-geral se deve a ataques em escolas e hospitais, em particular pelo uso de armamento explosivo com impacto em áreas amplas, incluindo artilharia pesada, lançamentos múltiplos de foguetes, mísseis e ataques aéreos em áreas residenciais com elevadas baixas e danos na infraestrutura.
Gamba promete continuar em contato com Moscou para implementação das medidas já identificadas, em agosto passado, durante sua visita ao país, para proteger os menores com base no que foi estabelecido.
No entanto, a Ucrânia foi advertida pelo secretário-geral devido ao grande número de mortes e assassinatos, além de ataques em escolas e hospitais atribuídos a suas tropas.
Gamba disse que, apesar de ser sabido, que as ações militares ucranianas são em resposta à agressão russa, as obrigações se aplicam a todas as partes em conflito, independentemente do fato das graves violações terem sido cometidas em posição ofensiva ou defensiva.
Grupos armados
Em todo o mundo, os ataques a escolas e hospitais subiram 12%, especialmente no conflito na Ucrânia e em áreas como Burkina Fasso, Israel, Territórios Palestinos, Mianmar, Mali e Afeganistão.
Metade das violações graves foram atribuídas a grupos armados não estatais. Nesses contextos, as forças governamentais cometeram grande parte de assassinatos, mutilações, ataques em escolas, hospitais e negação de acesso humanitário.
Exposição Infantil
O relatório Crianças e Conflitos Armados aponta que normas de gênero moldaram a exposição infantil a violações graves.
Em relação à Rússia e à Ucrânia, a organização disse ter verificado 2.334 violações contra 1.482 crianças. As informações não ilustram toda a escala de violações contra menores, “pois a verificação depende de muitos fatores, incluindo o acesso.”
No total, houve 91 crianças usadas pelas forças armadas russas e uma pelas tropas ucranianas como escudos humanos, como reféns e para tarefas domésticas ou coleta de informações.
Meninos foram privados de liberdade por autoridades ucranianas
Foi confirmada a detenção de seis rapazes pelas forças armadas russas, e uma parte deles sofreu maus-tratos e ou tortura.
Dois meninos foram privados de liberdade pelas autoridades ucranianas “por razões de segurança nacional” e outro sofreu maus-tratos.
O levantamento verificou 477 assassinatos atribuídos às forças russas e a mutilação de 909 menores. Pelo menos 658 casos foram atribuídos a grupos armados associados, enquanto as Forças Armadas ucranianas cometeram 255 violações.
Violações em Cabo Delgado
Moçambique é o único país de língua portuguesa que aparece no relatório publicado nesta quinta-feira. No conflito em Cabo Delgado, no norte, foram confirmadas 309 violações envolvendo 172 crianças. Pelo menos, 130 menores foram vítimas de diversos abusos.
Um total de 133 crianças foram recrutadas e usadas em ações de grupos armados não estatais para combate e apoio, algumas delas com apenas dois anos de idade. Um menor foi alistado por uma força local.
As forças de segurança moçambicanas teriam detido três rapazes por alegada associação com grupos armados, mas dois foram libertados.
Pelo menos 18 menores perderam a vida e um foi mutilado pelos grupos armados não estatais. Eles foram responsáveis pela violência sexual contra 17 meninas, incluindo casamento forçado. Cinco escolas e hospitais foram atacados na área do extremo norte.
Menores ucranianos transferidos para a Rússia
O secretário-geral, António Guterres, disse estar “consternado” com o elevado número de “violações graves” cometidas contra crianças na Ucrânia em 2022.
A situação causa choque pelos ataques contra escolas e hospitais, preocupação pela detenção de crianças e ainda pelo fato de alguns menores ucranianos terem sido transferidos para a Rússia.
O documento faz um apelo pela proteção de crianças, ressaltando o registro de violações graves contra 13.469 crianças, incluindo 2.985 mortas em 24 países e em uma região.
Aumento de 140% nas violações graves
A publicação do secretário-geral das Nações Unidas chama ainda a atenção para o alastramento de conflitos para novas áreas, no que “contribuiu para um aumento de 140% nas violações graves em Mianmar e um alta de 135% no Sudão do Sul”.
A ação de grupos armados, incluindo o Al-Qaeda e o Estado Islâmico, também agravou a situação no Sahel central, particularmente em Burkina Fasso que se destaca pelo aumento de 95% nas violações graves.
Fonte: Organização das Nações Unidas