Há vinte anos (mais ou menos), conheci o poeta Jaime Vieira do modo mais insólito possível. O encontro foi em um boteco de um paraíba que vendia comidas tradicionais nordestinas e claro, cachaça de alambique da boa. Eu, um garoto de 18 anos, e bem ali na minha frente um ídolo; naquela altura já tinha lido um tanto da sua obra. Sim, tratei logo de mostrar ao poeta as minhas obras completas; alguns cadernos preenchidos a caneta e lápis. Infelizmente, nada do que foi escrito naquele papiro egípcio sobrou, naquela arca da aliança encantada…
Enfim, o tempo passou, a vida andou, as experiências, leituras e fracassos se sucederam como tinha de ser. Até o dia fatídico que mandei, quase 25 anos depois daquele dia festivo, o conto experimental que abre o meu livro de estreia: “Canteiro de Obras” (ed. Viseu, 2023). E para o meu espanto, voltando de algum bar praiano; era janeiro, chuvinha fina, olho para o Facebook e vejo a resposta do Vate:
“Siga em frente, parabéns, estou curioso para ver o seu livro de estreia. Uma forte espontaneidade é expressada no seu texto, a sua capacidade de dizer aquilo que pensa e sente é tremenda. Muita leitura e qualidade lírica nos poemas etc.”. E assim, naquela noite meio borracho, obtive a glória através daquele assertivo comentário do escritor Maringaense (Paranaense). Para mim, o maior, o mais lírico, o mais contundente na expressão linguística que essa cidade já produziu. De fato, um pioneiro, pois seu livro de estreia “Desencontros” foi editado em 1974 pela incipiente gráfica da recém-fundada UEM. Dez anos depois, publicou um poema em parceria com o colega e grande poeta Curitibano Paulo Leminski (ciceroneava o “bandido que sabia latim” em suas andanças pela cidade canção); sem falar o prefácio inédito da poeta paranaense Helena Kolody que virá a lume na obra inédita intitulada “Contra Espelho”. Que venha o canto do cisne como brinca o poeta. Autor do premiado (internacionalmente) poema “Sonhos para John Lennon”.
E foi isso, claro, grosso modo, até surgir o prefácio e comentário na contracapa do primeiro livro (aquele do Facebook) e do segundo “Vate!” (Appris, 2024) lançado na Flim e Flip de 2024. Porém, mais do que tudo isso, uma amizade sincera nasceu, além da parceria poética e estética que poderá ser vista na epígrafe do meu próximo livro: “Desideratum”.
Ah, recentemente, em uma entrevista que demos juntos em pleno sábado de carnaval a respeito dos nossos livros, o Jaime disse ao vivo: “Estou passando o bastão para o poeta Daniel D´avila etc.”.
Ora, obrigado “padinho”, valeu mesmo, mais saiba que em termos artísticos, quem foi rei nunca perde a majestade. Afinal, a literatura não é e nunca será uma mera e descartável mercadoria. Portanto, um forte abraço para o autor da obra icônica e sui generis “ASAS” (1989). Asas elegantes de um autêntico cavalheiro, em todos os sentidos, como as suas brother Vieira. Toca Beatles, não, TOCA RAUL… Valeu!!
Daniel D´avila é escritor, poeta, professor e psicólogo clínico, autor de “Vate!” (Ed. Livre escrita, Appris, 2024) e “Canteiro de Obras” (Ed. Viseu, 2023).