“Um povo sem tradição morre a cada geração”
(Autor desconhecido)
A Cinemateca Brasileira é a instituição responsável pela preservação da produção audiovisual brasileira. Desde 1940, desenvolve atividades em torno da divulgação e da restauração de seu acervo, com cerca de 250 mil rolos de filmes e mais de um milhão de documentos relacionados ao cinema. Fisicamente, está situada no Largo Senador Raul Cardoso, 207, em São Paulo, onde de 1887 a 1927 encontrava-se o Antigo Matadouro Municipal de São Paulo.
Possui o maior acervo de “imagem em movimento” da América Latina, uma das maiores instituições do gênero do mundo. Ela preserva grande parte do conteúdo cinematográfico nacional, e por conta disso abriga a maior difusão do cinema brasileiro, com mais de dois mil rolos de filmes, os quais correspondem a 30 mil títulos entre as obra estrangeiras produzidas desde 1895, sendo assim, o acervo da biblioteca é formado por aproximadamente 4 700 documentos como certificados de censura, convites e também uma enorme coleção com cerca três mil roteiros e outros oito mil cartazes de filmes, dos quais 2,6 relacionados ao cinema nacional.
Além disso, possui também um amplo acervo de documentos do quais fazem parte livros, revistas, roteiros originais, fotografia e cartazes. Sua base de dados oferece a possibilidade de acesso online através do site da Cinemateca Brasileira.
História
O embrião do projeto da Cinemateca Brasileira nasceu quando Paulo Emílio Salles Gomes, na época bacharel em filosofia pela Universidade de São Paulo (USP), emigrou para a Europa e conheceu o museu vivo de cinema francês. A emigração se deu em um contexto de fuga, já que ocorreu logo após Paulo Emilio escapar da sua prisão por ter participado da Intentona Comunista de 1935. Durante sua estadia na França, o estudante trabalhou diretamente na Cinémathèque Française, e lá aprendeu sobre a importância da cultura de preservação das obras audiovisuais.
De volta ao Brasil em 1940, iniciou seu projeto para difundir essa cultura cinematográfica no país ao fundar, juntamente com colegas da USP como Décio de Almeida Prado e Antonio Candido de Mello e Souza, o primeiro Clube de Cinema de São Paulo. O Clube se propunha a estudar o cinema por meio de projeções, conferências, debates e publicações. Porém, o projeto não conseguiu se desenvolver. Criado durante o período do Estado Novo, sob o governo de Getúlio Vargas, o primeiro Clube de Cinema de São Paulo foi fechado pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), o que o forçou a operar de forma clandestina na residência de Emílio Machado e Lourival Machado a partir de 1941.
Após várias tentativas de se organizarem cineclubes, cinco anos depois, em 1946, foi oficializada a criação do segundo Clube de Cinema de São Paulo. Com direção composta por Almeida Salles, Múcio Porphyrio Ferreira, Rubem Biáfora, Benedito Junqueira Duarte, João de Araujo Nabuco, Lourival Gomes e Tito Batini, a associação foi responsável pela consolidação da ideia de Paulo Emílio e pela criação da Cinemateca Brasileira. A vivência de Paulo Emílio Salles como pesquisador na Cinemateca Francesa e a convivência do mesmo com Henri Langlois, diretor da instituição, são parcialmente responsáveis pelo seu comprometimento com a criação da Cinemateca Brasileira. Em setembro de 1947, ele filiou o Clube a International Federation of Films Society – IFFS (Federação Internacional dos Clubes de Cinema, em tradução livre), o que lhe permitiu acesso a uma pequena coleção de filmes. Porém, a real construção de seu arquivo fílmico veio em 1948, com a filiação à International Federation of Film Archives – FIAF (Federação Internacional de Arquivos de Filmes, e tradução livre).
Em março de 1949, o Clube estabeleceu um acordo com o então recém-criado Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM), para a criação da Filmoteca do Museu de Arte Moderna de São Paulo, com o intuito de fortalecer a produção cultural brasileira por meio de grandes mostras realizadas em conjunto com outras instituições culturais de São Paulo e objetivando a geração de espectadores com capacidade crítica. O desligamento do MAM em busca de maior autonomia veio em 1956, quando o clube se transformou em Cinemateca Brasileira, uma sociedade civil sem fins lucrativos com a intenção de preservar o patrimônio cinematográfico nacional e universal. Em 1984, a Cinemateca foi incorporada ao governo federal como um órgão do então Ministério de Educação e Cultura (MEC). No dia 12 de agosto de 2003, a Cinemateca Brasileira foi incorporada à Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura.
Obra do arquiteto Alberto Kuhlmann, a Cinemateca Brasileira foi implantada em 1992 no antigo matadouro municipal na Vila Mariana, região da Zona Sul na cidade de São Paulo. Seus edifícios históricos foram construídos em 1887 para receber o antigo matadouro da baixada do Humaitá (que existia desde 1856) e tombados pelo Condephaat – Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo, e restaurados pela entidade. Utiliza-se os edifícios remanescentes do “núcleo histórico” do antigo Matadouro, que foram restaurados e adaptados às suas necessidades atuais, como centro de documentação, áreas de apoio, sanitários e salas de cinemas e eventos. Além das antigas edificações, foram construídas também instalações para abrigar laboratórios de restauro de filmes, depósitos, arquivos de matrizes e áreas administrativas.
Ainda que, ao longo de sua história, a Cinemateca tenha sido incorporada por órgãos políticos, conseguir recursos para mantê-la sempre foi uma dificuldade dos fundadores. Tanto as instituições públicas quanto as privadas exerciam certa resistência em financiar os projetos e ceder capital. Os mecenas, como Assis Chateaubriand e Francisco Matarazzo Sobrinho, não viam motivos para que houvesse um “museu” de elementos audiovisuais. Já o poder público muitas vezes recusava-se a financiar esse centro de distribuição e preservação paralelo, dando preferência ao circuito comercial de cinema.
Algo semelhante que aconteceu com a Rádio Nacional também aconteceu com a Cinemateca Brasileira onde tinham registros do nosso país e da memória do povo brasileiro de 120 anos quando o Brasil estava na fase da política Café com Leite. Muito triste um povo que não preserva a sua memória, é como se tivesse deletado o cotidiano de mais de um século. Que essa geração de jovens possa valorizar daqui para frente a nossa alma e memória.
Obrigado pela leitura!
Colaboração: Anna Janssen
Atenciosamente, Vital Ben Waisermman.