Nesta última semana, assistimos a mais um capítulo da novela da vida real protagonizada pela Prefeitura de Maringá e cujo vilão da vez é a empresa TCCC (Transporte Coletivo Cidade Canção), para a surpresa de ninguém. Não são de hoje as rusgas e embates envolvendo o executivo municipal e a referida empresa concessionária.
É de se esperar que, durante a vigência de um contrato de concessão de longa duração, como é o caso, ocorram conflitos de interesses entre as partes, mas preocupa o fato de a TCCC ter de demandar judicialmente a Prefeitura para ver cumprido o contrato firmado no longínquo ano de 2011.
A razão para o ajuizamento da demanda foi o fato de que, desde junho de 2019, a administração pública municipal não promove o reajuste da tarifa referente à utilização do transporte público, o que vem causando uma série de transtornos financeiros à empresa concessionária.
Não é preciso ser versado em economia para saber que, ano a ano, a inflação e a modificação do cenário econômico levam à alta nos preços dos combustíveis, elevação do valor dos insumos, isso sem falar na questão de pessoal, com o acréscimo do valor do salário-mínimo e do salário-base das categorias de trabalhadores. Por isso, mais do que uma obrigação contratual e legal, o reajuste anual visa a manter o equilíbrio da avença firmada, a fim de não torna-la excessivamente onerosa para uma das partes.
Entretanto, em junho de 2020, a Prefeitura simplesmente não promoveu o reajuste, e também não o fez neste ano de 2021, deixando a empresa concessionária à sua própria sorte. É claro que tal omissão, mais do que prejudicar a pessoa jurídica, atinge diretamente os trabalhadores. Sim, porque são estes que, na ponta, não terão seus salários pagos. Não por outra razão, os empregados da TCCC entraram em greve no mês de abril do corrente ano reivindicando justamente o pagamento pontual de seus salários.
Instada a se manifestar, a Prefeitura confirmou que, de fato, deixou de cumprir o comando legal e o ajuste contratual, mas que assim procedeu por causa da situação da pandemia causada pelo coronavírus (COVID-19), a fim de evitar a oneração excessiva do usuário do serviço.
Essa justificativa apresentada pelo executivo municipal está no mesmo nível da célebre desculpa “o cachorro comeu meu trabalho”. Ora, a Prefeitura deveria ser a primeira a cumprir com as suas obrigações legais e contratuais, não só para dar o exemplo a nós, cidadãos pagadores de impostos, mas para garantir que o serviço público tenha continuidade e seja executado a contento. O inadimplemento por parte do ente público dá margem a que a outra parte faça o mesmo.
Além disso, o descumprimento do contrato, notadamente no que toca à remuneração, pode causar graves e irreparáveis prejuízos à parte, o que de fato ocorreu, tanto que a TCCC atrasou o pagamento do salário de seus funcionários, ocasionando uma greve no primeiro semestre desse ano, que culminou com a interrupção da prestação do serviço público.
É evidente, portanto, que a falta do reajuste causou uma excessiva onerosidade à empresa concessionária, aos seus trabalhadores e também ao usuário do serviço. Ou seja, o poder público, com essa omissão conseguiu prejudicar até mesmo aquele que visava supostamente proteger. Lembra que no início, tinha escrito que era mais um capítulo da novela? Quem dera fosse, infelizmente é a vida real do maringaense.
Agora fica o questionamento: será que o cidadão pode fazer o mesmo? Isto é, simplesmente deixar de pagar os impostos municipais sob a justificativa da pandemia? Teremos a mesma prerrogativa? É claro que não. Hipocrisia, a gente vê por aqui.