Retorno à comunidade

Dom Frei Severino Clasen
Arcebispo Metropolitano de Maringá

Os acontecimentos, na cruz, da trágica morte de Jesus, a surpreendente notícia de sua ressurreição, abalaram o sistema sócio-político, em Jerusalém e região.

Nunca se ouviu dizer algo semelhante. Curiosas são as notícias relatadas pelas mulheres e alguns dos seus seguidores, à maneira como apareceu diante deles com a mensagem transmitida.

A constante de sua fala nas aparições é de encorajamento, transmite paz, encaminha os para a vida, em comunidade. Caminhando e dialogando com os discípulos de Emaús cita Moisés, os Profetas e os Salmos.

A ressurreição de Jesus não é algo de última hora. Há séculos de anúncios, de revelações e ensinamentos. Ele mesmo afirma: “São estas as coisas que vos falei quando ainda estava convosco, era preciso que se cumprisse tudo o que está escrito sobre mim na Lei de Moises, nos Profetas e nos Salmos” (Lc 24,44).

A narrativa dos discípulos de Emaús (Lc 24) é o exemplo clássico do abandono e do retorno à comunidade. Eles, após a morte de Jesus, tristes, deixam Jerusalém, retornam para Emaús. Ao lugarejo para o qual se dirigiam, representa o anonimato, o isolamento, vida sem perspectivas.

Deixam o seio da comunidade, partem para o vazio existencial. Vivenciam a desolação, tristeza, relembram, que “ele somente fez o bem”. A morte de Jesus mergulhou-os, em profunda frustração. Todo o bem do mestre foi ignorado enquanto, distanciavam-se da comunidade.

Jesus, disfarçadamente, Jesus, ao caminhar com eles, retoma toda a história humana, que está construída na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos. Eis a tríade da verdadeira comunidade: A Lei, a Profecia, a Salmodia.

A Lei é a orientação para dar segurança jurídica e firmeza à vida. Está a serviço da vida. O tempo da pandemia mostra-nos essa veracidade inconteste. Quem segue a orientação das Normas Fundamentais preserva, protege a vida. Moisés é o símbolo do homem veterotestamentário que recebeu de Deus a Lei, os mandamentos para seguir o rumo certo ao percorrer a vida; o povo caminha com segurança à direção da terra prometida. Quando se burla a lei, toma-se outros caminhos, prejudica nossos semelhantes, cria as situações de desavença, distúrbio sócio-ambiental, quebra a harmonia na comunidade, destrói a ordem estabelecida, a comunidade se desmorona.

A Profecia é a Palavra por Deus. É a palavra pronunciada pelos profetas. Deus inspira, conduz ilumina, para que a verdade seja seguida, vivenciada. Na Palavra autêntica, o Profeta não fala por si, o que quer, nem o que o povo quer ouvir, ou a que for dita. Há um endereço da verdade profética e ela vos libertará.

Os Salmos, prática da oração, da meditação diária faz-nos descansar no coração de Deus e com Ele crescemos no relacionamento saudável entre os humanos, em fraternidade, na comunidade organizada. Eis a força da comunidade. O espírito bom constrói uma autêntica comunidade que acolhe e cuida de todas as pessoas.

Retornar à comunidade é voltar-se a Jesus Cristo ressuscitado. Ele caminha conosco, nos inspira a seguir a disciplina; é a palavra iluminadora de Deus que, em comunidade, rezamos, celebramos e praticamos a caridade: o dom de Deus. Trago aqui o poema do Cônego Benedito Vieira Telles:

Caminhantes a Emaús

Dois discípulos vão a Emaús,

Medrosos do fato, em Jerusalém.

De repente, entre eles está Jesus,

Nem percebem o Mestre até além.

 

A anoitecer, no horizonte, do sol,

Caminhavam três, entre os dois, Jesus.

Suas palavras espargiam luz…

Declinava a tarde, o fim do arrebol!

 

Neste encontro nota-se a catequese,

Que falta aos discípulos de Emaús.

Retira-se Jesus… – Pois, fique! É tarde!

 

Ao compartir o pão e o abençoar,

Jesus lhes deu… A se reconhecer.

Páscoa, em Emaús, foi a anoitecer!

 

Uma abençoada semana a todos os leitores.

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