A Universidade Estadual de Maringá (UEM) comemora, neste dia 20, quatro anos de implantação do Sistema de Cotas Raciais nos processos seletivos de ingresso na graduação. Ao todo, nos três últimos anos, entraram na UEM, pelo sistema de cotas, 378 vestibulandos negros. A entrada desta população está crescendo gradativamente: em 2021, entraram 98 estudantes, em 2022, 116 e em 2023, 164.
As cotas configuram uma política de reserva de 20% das vagas dos vestibulares destinadas para negros (pretos ou pardos), divididas em duas categorias: a primeira é a Cotas para Negros Social que se configura como a reserva de 15% das vagas para alunos negros que também atenda os critérios das cotas sociais; a segunda é cotas para negros que se configura como a reserva de 5% das vagas independente do ganho familiar, trajetória escolar e/ou patrimônio.
17ª Semana Afro-brasileira
A 17ª Semana Afro-Brasileira do Núcleo de Estudos Interdisciplinares Afro-Brasileiro (Neiab), da Universidade Estadual de Maringá (UEM), acontece nos dias 28, 29 e 30 próximos no Blocoo H12 do câmpus sede como parte da programação do Mês da Consciência Negra, para lembrar a resistência do povo negro ao longo da história e promover a reflexão sobre a igualdade racial, a importância do reconhecimento das contribuições culturais, sociais e econômicas dos afrodescendentes.
“Mesmo após 20 anos da Lei 10.639, que tornou obrigatório o ensino da História e Cultura Afro-Brasileira nas escolas públicas e particulares de ensino fundamental e médio, até hoje, a maioria delas não são espaços amplamente receptivos para crianças negras. Por isso, este ano a temática do evento é 20 anos da Lei 10.639/2003: estratégias para uma educação antirracista”, explica Marivânia Conceição Araújo, professora de Ciências Sociais da UEM e coordenadora do Neiab/UEM.
Segundo Araújo, a programação do evento prevê mesas redondas e palestras com especialistas no tema, atividades que permitirão uma reflexão sobre a importância da lei, sua aplicação e como isso muda a educação brasileira. Os participantes inscritos receberão certificados de participação.
Um dos principais destaques da programação da 17ª Semana Afro-brasileira é a palestra de abertura com a professora Alessandra Pio Silva, professora doutora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), pedagoga e especialista em ensino fundamental. Ela vai apontar os gargalos do setor no tocante às relações raciais e a importância de ampliar o letramento racial da comunidade pedagógica a fim de que os integrantes dela estejam aptos a reconhecer, criticar e combater atitudes racistas em seu cotidiano.
A estudante de Pedagogia e agente de segurança da UEM, Miriam Suellen de Oliveira, entende a importância da reeducação racial. Ela revela que o momento mais difícil de sua vida foi na infância, pois sofreu muito preconceito na escola. “O preconceito mais violento é quando a gente é criança. Sofri muito racismo na escola devido a cor da minha pele e, principalmente, o meu cabelo. Na década de 1990, não se falava muito sobre esse assunto. Nem a professora, tampouco a diretora levavam estes episódios muito a sério. Eu não tinha nem respaldo familiar, porque fui criada pela minha avó, neta de escravos, e ela sempre estava trabalhando, mas também acredito que mesmo que ela tivesse tempo não iria saber como se defender”, relata Oliveira.
Para a coordenadora do Neiab, até hoje, apesar da legislação punitiva para atos discriminatórios, a maioria do corpo docente das escolas não está preparada para situações de preconceito racial. “Muitos até compactuam com o racismo, não acolhem, nem valorizam os alunos negros”, lamenta Araújo. Ela entende que o avanço para que a sociedade brasileira chegue à igualdade racial está atrelado a pelo menos três fatores: educação, trabalho e punição.
Araújo acredita que as atividades antirracistas devem ser uma constante o ano todo nas escolas de todos os níveis e não somente no mês de novembro, em virtude do Dia da Consciência Negra. “E em relação aos locais de trabalho, é preciso que todos ofereçam as mesmas oportunidades de vagas aos candidatos, independentemente da cor de pele. Eles não devem privilegiar ninguém, todos devem ser tratados com igualdade. E para finalizar, é necessário que a lei seja cumprida, pois vemos diariamente casos de racismo impunes. Racismo é crime inafiançável que precisa ser cumprido pela justiça. É preciso que pessoas brancas também participem desta luta. Quanto mais pessoas se envolverem com a causa, mais chances teremos de mudar a sociedade”, conclui Araújo.
Igualdade racial depende de maior representatividade negra
Na avaliação de Oliveira, hoje o racismo é mais velado. “Somos seguidos, quando entramos numa loja, não é nada muito direto, mas percebo. Vejo isso também acontecer com meus sobrinhos. Acredito que para termos igualdade racial precisamos de maior representatividade. É preciso criar mais políticas públicas de acesso do povo negro, não só em relação às cotas que já existem no vestibular, concurso, mas possibilitar que essas pessoas, também ocupem suas posições em diversos setores da sociedade, como na política, cultura, educação, negócios, entre outras áreas. A pauta negra era sempre debatida por pessoas brancas, hoje um pouco menos, sendo que eles não têm propriedade nenhuma para falar da nossa causa e a gente não se vê representada por eles. Aqui na UEM mesmo, vemos pouquíssimos professores negros. Eu estou no segundo ano de pedagogia aqui na UEM e só agora fui ter um professor negro este ano. Eu fiquei muito feliz de ver um professor negro ali na frente e me senti representada. Fiquei não só feliz por ele, mas também por todas as outras pessoas negras que estão entrando aqui na UEM”, diz a estudante.
O estudante do 4º ano de Ciências Sociais e estagiário do Neiab, Samuel Monteiro Lopes, pondera que a educação e punição são fundamentais para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva. “Para avançarmos no quesito da igualdade racial, o principal passo é o judiciário. É necessário punir as pessoas que praticam o crime de racismo, está inclusive na lei, é crime. A educação também é uma arma, talvez a principal. É preciso mostrar que as pessoas negras também são belas, são morais, são inteligentes. Esse conceito de branquitude, da concepção de que tudo que é branco é bom, é perfeito, tem que ser desconstruída”, sentencia Lopes.
Os três entrevistados desta reportagem foram unânimes em frisar que a luta pela igualdade racial não é somente no dia de hoje e também não só dos negros. Ela deve ser diária e agregar todas as etnias.
Dia da Consciência Negra
A luta e a constante discussão pela igualdade de direitos ocorrem há séculos e têm como referência no Brasil, o Zumbi dos Palmares, um líder, revolucionário e estrategista que, junto a outros líderes, representava a resistência negra à escravidão. Por isso, a data de sua morte, 20 de Novembro, foi instituída oficialmente pela Lei Federal nº 12.519 como o Dia Nacional da Consciência Negra.
Depoimento do reitor da UEM, professor Leandro Vanalli, sobre o Dia da Consciência Negra
A vice-reitora da UEM, professora Gisele Mendes, fala sobre o Dia da Consciência Negra
SERVIÇO
XVII Semana Afro-brasileira
Quando: 28, 29 e 30 de Novembro
Onde: UEM – Bloco H12 Sala 14
Inscrições: Clique aqui
Programação
28 de Novembro
19h
– Apresentação Cultural – Andrey Cruz
– Palestra de abertura –
Palestrante: Profa. Dra. Alessandra Pio Silva
Mediação: Profa. Dra. Marivânia Araújo
29 de Novembro
9h
– Mesa redonda: Educação antirracista e a cultura
Participantes: Diego Cartano, Lissandra da Silva e Victor Simião
Mediação: Andrey Cruz
19h
– Mesa redonda: Educação antirracista e as religiões de matriz africana
Participantes: Eronildo Silva e Gislaine Gonçalves
Mediação: Bruno Barra
30 de Novembro
9h
– Mesa redonda: Educação antirracista e a ERER no ensijno superior
Participantes: Alessandra Medina, Josiane Gouveia e Marinalva Maximo
Mediação: Ana Paula Herrera
19h
– Mesa redonda: Educação Antirracista e a efetivação da Lei 10.639/2003 na universidade
Participantes: Josiane Oliveira, Marivânia Araújo e Loide Nascimento
Mediação: Eliane Oliveira